terça-feira, abril 28, 2009

A velocidade das coisas...

Foto: © Daniel De Granville, 2008


Alguns pensamentos que tive hoje sobre a fotografia na era digital.

Começou na segunda-feira passada, quando encontramos professores universitários do Rio de Janeiro que havíamos conhecido durante uma viagem de campo deles ao Pantanal em 2004. Ao final da conversa, decidimos tirar uma fotografia juntos e comentamos que não vimos fotos daquela excursão. Só então recordamos que, naquela época, pouquíssimas pessoas possuíam equipamento digital, e celular com câmera ainda era coisa do futuro. Daí lembrei que 2004 foi o ano de aquisição da minha primeira câmera digital, uma Canon EOS 10D.

Corta para o dia de ontem, quando fui fazer as fotos para uma pousada aqui de Bonito que já havia fotografado em 2002. Acabei de passar os arquivos dos cartões de memória para o computador: exatas 227 imagens, sendo que ainda falta fotografar os apartamentos por dentro (ou seja, certamente passarei dos 300 cliques). Naquelas seções fotográficas de sete anos atrás, usei no máximo 2 rolos de filme, ou 72 fotos...

Finalizando, vira e mexe eu dou uma repassada em todos os 10 cartões de memória que tenho em casa, pra garantir que nenhuma imagem acabou ficando pra trás sem ser salva no computador. Hoje encontrei umas fotos despretensiosas que tirei há uns 15 dias. Minha sensação foi a mesma de contemplar fotos antigas esquecidas em um velho álbum, e que eu nem lembrava mais da existência.

É, as coisas estão mesmo mudando neste mundo fotográfico...

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quinta-feira, abril 23, 2009

Música Para os Ouvidos

Pesquisas mostram como o canto de aves
pode ajudar a tratar nossa saúde

Texto: © Daniel De Granville, 2007-2009


Foto: © Daniel De Granville, 2006


São seis e meia da manhã. Você ainda nem abriu os olhos, mas da cama já pode escutar a melodia de bem-te-vis, sabiás e tico-ticos vindo do outro lado da janela. Acordar com o som das aves pode ser trivial tanto no campo como em grandes cidades, mas ainda que para a maioria das pessoas esta riqueza sonora passe despercebida, para alguns cientistas o canto dos pássaros tem se tornado objeto de pesquisas que podem trazer boas novas à medicina humana.

Um pioneiro nestes estudos foi o zoólogo argentino Fernando Nottebohm, há 40 anos estabelecido na Universidade Rockefeller (EUA). Em 1983, suas pesquisas culminaram em publicações que afetaram o conceito científico secular de que neurônios não surgiam em indivíduos adultos. Analisando como canários-do-reino (Serinus canarius) aprendem novas canções, sua equipe comprovou a neurogênese – nascimento de novos neurônios – em cérebros maduros destas aves. Frente à descoberta revolucionária, Nottebohm foi duramente questionado por parte da comunidade científica, mas o trabalho serviu como estímulo para estudos posteriores que comprovaram o fenômeno em animais evolutivamente mais próximos ao homem, como os macacos-rhesus.

A hipótese de novos neurônios se formando em adultos humanos daria início a uma nova era no tratamento de problemas neurológicos decorrentes de traumas acidentais ou doenças, desde o Mal de Parkinson e a esclerose múltipla até derrames cerebrais e o Mal de Alzheimer.

Fernando Nottebohm no seu centro de pesquisas
de campo em Millbrook, Nova York
Foto: CORTESIA ROCKEFELLER UNIVERSITY


Enquanto Nottebohm prospera nas pesquisas, recebe prêmios acadêmicos e aparece em publicações prestigiadas como a National Geographic (uma foto dele com seus objetos de estudo estampa a edição de novembro de 2007 da revista), outras frentes relacionando humanos e canto de aves – desde ciência clássica até terapias alternativas – vêm se abrindo. É o caso do indiano Santosh Helekar, doutor em neurofisiologia que também deixou sua terra natal para viver nos EUA. Em junho passado, sua equipe do Hospital Metodista de Houston publicou artigo no periódico da Academia Nacional de Ciências dos EUA (PNAS) sobre respostas neurofisiológicas de mandarins a estímulos sonoros.

Os mandarins (Taeniopygia guttata), originários da Austrália, são bastante utilizados em pesquisas neurológicas por possuírem em seus cérebros áreas bem definidas relacionadas ao canto. Por meio de técnicas de ressonância magnética, os pesquisadores compararam a resposta cerebral destas aves quando seletivamente submetidas a sons diversos. Em todas as ocasiões notou-se que o hemisfério direito era capaz de discernir melhor os sons. “Não sabemos exatamente o que acontece no cérebro humano quando um paciente gagueja ou apresenta outros distúrbios da fala. Mas se compreendermos como os sons são seletivamente processados por mandarins, talvez possamos utilizar estes achados para tratar tais pessoas”, afirma o Dr. Henning Voss, primeiro autor da publicação. O fato de que alguns indivíduos de pássaros canoros jovens repetem insistentemente determinados trechos do canto aprendido com os pais – uma forma de gagueira, na opinião do Dr. Helekar – pode ajudar nesta busca por pistas que levem à melhor compreensão dos mecanismos envolvidos no gaguejar humano.

Outro achado que remete ao pioneirismo de Nottebohm, ainda que não diretamente ligado à saúde humana mas dentro do campo da fala, foi publicado em abril de 2006 pelo Dr. Timothy Gentner, do Departamento de Psicologia da Universidade da Califórnia. Estudando estorninhos-europeus (Sturnus vulgaris), Gentner comprovou que eles dominam a recursividade, componente gramatical até então considerado exclusivo da linguagem humana. Trata-se da capacidade de construir frases dentro de frases infinitamente, como no exemplo “o pássaro, que era amarelo, vinha à minha janela, que eu deixava sempre aberta, todos os dias”. Mais uma vez, os pássaros indicam a necessidade de se revisar de um conceito científico consagrado – exatamente como no caso da neurogênese.

O canto das aves aparece também em temas controversos dos quais, afinal, alimenta-se a ciência. Nas terapias alternativas, o médico inglês William Bird, da entidade ambiental Natural England, defende seu uso e para reforçar esta posição cita estudo publicado em 2003 no respeitado periódico Chest, da Sociedade Americana de Pneumologistas. Nele, os autores afirmam ter reduzido significativamente os níveis de dor durante broncoscopias – uma prática altamente invasiva para exame dos pulmões – expondo os pacientes a cantos de aves e imagens de natureza, ao invés de usarem medicamentos tradicionais.

Fernando Nottebohm afirma não acreditar na eficácia de tais práticas, mas parece que em Liverpool o estudo causou entusiasmo. O renomado Hospital Infantil Alder Hey, um dos maiores da Europa com mais de 200 mil atendimentos por ano, firmou em setembro último parceria com o colecionador de sons naturais Chris Watson. O projeto inclui a aplicação do canto das aves do Parque de Springfield – tanto vindo pelas janelas como pelos tocadores de MP3 dos pequenos pacientes – como método auxiliar na sua recuperação.

Chris Watson especializou-se em gravar
sons de natureza para fins terapêuticos
Foto: DIVULGAÇÃO | CHRISWATSON.NET


Já no Brasil, que com mais de 1800 espécies ostenta a segunda maior diversidade mundial de aves, ficando atrás apenas do Peru, não há estudos científicos conhecidos que envolvam cantos e saúde humana. Por enquanto esta relação entre homens e vozes de aves limita-se a iniciativas pessoais e isoladas como os CDs de paisagens sonoras do engenheiro paranaense Beto Bertolini, além de pesquisadores e entusiastas que se dedicam à bioacústica – caso do francês Jacques Vielliard e do ugandense Jeremy Minns, ambos radicados há décadas no Brasil. Para o Dr. Nottebohm, este aparente paradoxo – abundância de material disponível versus total ausência de trabalhos científicos – pode ser devido à simples carência de financiadores para tais estudos. “O desejo de ver pesquisas realizadas sempre esbarra na necessidade de quem irá pagar por elas”, conclui.

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Este artigo foi originalmente escrito por mim no final de 2007, como trabalho de conclusão de uma das disciplinas da pós-graduação em Jornalismo Científico (Labjor/Unicamp), e agora atualizado com algumas novas informações.
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quarta-feira, abril 15, 2009

Concurso Avistar 2009: Resultados

Uma das fotos que inscrevi no concurso deste ano
Foto: © Daniel De Granville, 2008



Saiu hoje o resultado do 3° Concurso Avistar Itaú BBA de Fotografia "Aves Brasileiras". Desta vez não deu: após ter três imagens premiadas nas duas edições anteriores da competição, este ano não obtive o mesmo sucesso.

Mas fiquei muito feliz em perceber o nível cada vez melhor das fotos vencedoras, com algumas imagens sensacionais, além de notar que o pessoal está investindo bastante em bons equipamentos. Isto é excelente para popularizar e fomentar nos brasileiros o gosto pela nossa vida selvagem e pela fotografia de natureza.

Parabéns aos vencedores e espero vê-los no IV Encontro Brasileiro de Observação de Aves (Avistar 2009) em maio!

domingo, abril 12, 2009

Todo dia eu vejo uma ave...

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O artigo a seguir, originalmente publicado em minha coluna no PortalBonito há algumas semanas, foi escrito antes da aprovação por unanimidade da Lei que criou em Bonito o Dia Municipal das Aves (03 de Outubro) e oficializou o Udu-de-coroa-azul como a Ave Símbolo do município. Saiba tudo sobre esta ótima novidade no blog BonitoBirdwatching!


Udu-de-coroa-azul, recém-eleita Ave Símbolo de Bonito!
Foto: © Daniel De Granville, 2005



"Todo dia eu vejo uma ave"


Invariavelmente, nossas rotinas nos deixam tão acostumados a certas coisas que nós nem reparamos mais nelas. Seja o som de algum aparelho de casa, sejam as cenas que você vê todos os dias no seu caminho para o trabalho. Mas se pararmos para prestar atenção, tem muitas coisas bonitas e interessantes cruzando nosso caminho diariamente. Um bom exemplo são as aves.

Não importa se você mora em uma grande metrópole como São Paulo ou em uma fazenda isolada no meio do Pantanal. Todo dia você acaba vendo uma ave – pode até não reparar, mas elas estão lá te olhando e pedindo para serem vistas por você. Tente observar isto, hoje mesmo ao voltar para sua casa ou simplesmente descansando no seu quintal durante o fim de semana.

Na cinzenta e poluída São Paulo, mais de uma vez pude ver, da janela do ônibus preso no congestionamento, periquitos alimentando-se tranquilamente nas árvores de alguma pracinha. E sou capaz de garantir que, mesmo quem passa o dia trancado em um escritório no topo de um edifício, mais cedo ou mais tarde vai observar sua ave do dia. Todo dia. Pode até não topar com outros bichos, como um cachorro, um gato ou um grilo, mas aquela pomba em cima do muro ou o bem-te-vi pousado na rede elétrica vai estar lá!

Nós, aqui em Bonito, somos muito mais privilegiados. Vivendo na Serra da Bodoquena, região que já tem mais de 400 espécies listadas, observar aves no dia-a-dia é “moleza”. Um bom exemplo? Somente no bairro onde moramos, a menos de 2 km do Centro, sem fazer nenhum esforço específico – ou seja, sem acordar cedinho e sair com o binóculo em punho – já conseguimos ver cerca de 80 espécies!

Mesmo que nós ainda não tenhamos despertado para as aves à nossa volta, muitos visitantes de Bonito já buscam por elas, conseqüência do aumento de praticantes do turismo de observação de aves no Brasil. Este segmento está apenas começando a se desenvolver na região, mas tem muito potencial! Vide o Projeto Economia da Experiência iniciado esta semana por aqui.

De fatos como esse, associado ao sucesso do Curso de Observação de Aves que ministramos em Bonito em outubro passado, surgiu a idéia de se criar uma CULTURA DAS AVES na cidade, começando com a oficialização do udu-de-coroa-azul como "Ave Símbolo de Bonito" e 3 de outubro como "Dia Municipal das Aves".

O Udu é o mais forte candidato pela sua beleza e por não haver no planeta algum lugar onde se veja estas aves com tanta facilidade como em Bonito. O dia 3 de outubro, no auge da melhor estação para se observar aves, integraria uma espécie de “Semana da Ave”, já que no dia 2 comemora-se o aniversário de Bonito, 4 é Dia de São Francisco (protetor dos animais) e 5 é o Dia Mundial das Aves.

Assim, ao associarmos um pássaro tão belo e simbólico com a nossa cidade, estaremos dando um importante passo em direção não apenas à consolidação do turismo de observação de aves, mas também para despertar na comunidade o interesse e a vontade de conhecer e preservar estes animais, uma das maiores riquezas da Serra da Bodoquena!

E você, já viu sua ave hoje?!
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