À minha frente, um grupo de paraguaios come, bebe e canta efusivamente (ao menos eu presumo que são paraguaios porque o Paraguai é aqui do lado, mas pelos trajes não tem como saber, já que suas roupas não parecem nada típicas). Atrás da mesa deles, o conjunto – na verdade uma dupla de tecladista e vocalista – entoa um pout-pourri com versões instrumentais de eternos sucessos incluindo “Only You”, “Solamente Una Vez” e “Garota de Ipanema”. Um dos senhores da tal mesa ameaça levantar-se para cantar junto dos músicos. Seus amigos o incentivam, mas ele desiste. Até agora estou sem saber se achei bom ou ruim ele não ter ido em frente.
São 11 horas da noite, estou jantando no restaurante do hotel após um dia intenso de fotografias na área da Usina Hidrelétrica de Itaipu. Este é o oitavo dia de um total de 25. Acabo de passar as fotos para o computador, editar as imagens, fazer backup e passar a limpo as anotações do dia – que foi bem longo, como sempre costuma ser.
Hoje fotografei um pouco de tudo: animais como jacarés e onça-pintada, viveiros de plantas, pessoas gordas e magras, rios, paisagens. Fotografei também um trabalho de resgate de peixes dentro da estrutura da usina.
Periodicamente, uma das 20 turbinas de Itaipu é desligada para manutenção, e então entra em campo a equipe de profissionais responsável por capturar e salvar peixes que porventura fiquem presos dentro da estrutura. Isto não estava na minha pauta, mas como eu imaginei que pudesse render boas imagens, lá vou eu me enfiar pelos dutos da maior usina hidrelétrica do planeta.
Nossa caminhada começa por uns longos corredores de concreto estreitos, úmidos, quentes e irregularmente iluminados, que por algum motivo me lembraram Dachau, na Alemanha (ainda bem que as semelhanças são apenas na parte estrutural). Nunca fui claustrofóbico, mas por alguns momentos senti algo estranho. E era só o começo...
Do primeiro corredor nós pegamos um elevador e rapidamente subimos cerca de 25 metros até um segundo caminho ainda mais estreito, que leva a uma escada em espiral amarela de metal, que leva a uma mini-sala cheia de alavancas, controles e medidores, que leva a uma espécie de escotilha, que finalmente leva a uma escadinha parecida com essas de piscina, por onde descemos na escuridão total. Pronto, lá estou eu dentro do duto. À minha frente, nada de paraguaios comendo e cantando e dançando, mas sim um paredão de aço cheio de rebites enormes que segura toda a água represada no Lago de Itaipu – ou quase toda, já que parte escorre pela tal parede e cai do teto em forma de goteiras, deixando o piso extremamente escorregadio. Uns cinco metros atrás de mim está um abismo de 40 m que termina na turbina. Resisto bravamente à tentação de perguntar quantos metros estamos abaixo da lâmina d’água – e o que aconteceria se alguém hipoteticamente esquecesse que estávamos lá dentro e abrisse as comportas. Desta vez – ao contrário da minha dúvida quanto ao senhor paraguaio cantar ou não – tenho a certeza de que foi melhor ficar quieto e apenas ouvir as instruções.
O técnico responsável pela operação de resgate dos peixes me dá a ordem expressa para não sair de perto dele, em hipótese alguma. Acho que ele se assustou um pouco comigo esta manhã, quando cheguei perto demais de uma mamãe jacaré com seus filhotes. Para tranqüilizá-lo, digo para não se preocupar, pois de bicho eu não tenho mesmo muito medo, mas essas coisas de usina e turbina e abismo escuro eu respeito.
E lá vai ele para baixo do paredão, puçá, lanterna e balde na mão, tentar salvar algum peixe na água empoçada. Busca lá, busca aqui, mas nada – felizmente todos os peixinhos daquela área parecem estar sãos e salvos. Fico contente por eles, mas meio frustrado por não ter conseguido uma boa foto do resgate.
Sem problemas, amanhã tem mais, vou novamente com o pessoal a um ponto “mais legal” (dentro da turbina!) e onde as chances de resgatar peixes presos no duto são maiores...
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