sábado, outubro 21, 2006

Muito Bicho ou Pouco Espaço?

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Concentração natural de aves durante a seca no Pantanal
FOTO © Daniel De Granville, 2003



O texto de hoje é inspirado em matéria que escrevi há cerca de um ano, e agora dois fatos chocantes esta semana (links abaixo) me levaram a retomar o tema. Nossos bichos estão sofrendo.


FOLHA DE S. PAULO
Em extinção, veado tem corpo queimado em canavial

JORNAL NACIONAL
Animais vão para as cidades | LEIA | ASSISTA |



Como biólogo e fotógrafo de natureza, o meu grande interesse sempre foram os animais silvestres, e encontrá-los em seu ambiente natural é um dos principais objetivos quando estou em campo. Fotografar aves, mamíferos, peixes, jacarés e invertebrados livres na natureza exerce um fascínio especial. E, geralmente, quanto mais bicho melhor.


Carcaça de jacaré, provavelmente morto por caçadores,
flutua em rio do Pantanal

FOTO © Daniel De Granville, 2006


Durante um trabalho fotográfico que fiz para a Conservação Internacional, fiquei impressionado com a quantidade de animais que vi em uma curta caminhada: bandos de macacos, queixadas, quatis, araras e tatus. Porém, ao mesmo tempo em que me senti feliz por manter um contato tão próximo com a vida selvagem, fiquei muito preocupado. Deixem-me explicar.

De maneira simplificada, todo ambiente natural comporta uma determinada quantidade de espécies e um tanto de indivíduos de cada espécie. Isto está associado às características do ambiente no que se refere à variedade e abundância de alimentos e de abrigo. Uma população de determinado animal se controla naturalmente de acordo com a oferta destes fatores. Assim, da mesma forma que a ausência de alguns bichos pode indicar que eles foram eliminados de lá devido a alterações na área, a presença excessiva de certos animais também pode ser indicativo de impacto ambiental. No caso deste lugar que eu fui, a mata era um dos últimos remanescentes intactos nos arredores. O restante era pastagem e lavoura. Ou seja, esta grande concentração de bichos pode ser conseqüência deles não terem mais para onde ir – conforme o desmatamento avança, eles procuram se refugiar nos lugares que sobraram.

Só que muitos animais em um espaço pequeno pode gerar problemas: primeiro, a pressão sobre os recursos naturais aumenta de forma descontrolada. Os macacos, por exemplo, podem começar a se alimentar dos ovos e filhotes nos ninhos das aves até eliminá-las de lá. Com estas aves desaparecendo, pode acontecer de determinadas espécies de plantas que dependem das aves para se disseminar virem a sumir também, em um processo cíclico e muito prejudicial ao equilíbrio natural.

A outra conseqüência negativa é com relação à chamada variabilidade genética. Com muitos indivíduos de uma espécie vivendo confinados em um ambiente reduzido, começam a ocorrer cruzamentos entre “parentes”, e isto torna a população muito homogênea e frágil em termos genéticos. Como resultado, estes animais ficam vulneráveis a doenças ou modificações no ambiente, tornando-se suscetíveis a extinções locais.
É meio chato pensar assim, mas cada vez que eu vejo notícias de araras e outros animais “do mato” aparecendo em áreas urbanas – coisa que não acontecia antes, conforme algumas pessoas mais antigas testemunham – fico preocupado com os motivos que podem ter levado estes bichos a “apelarem” para a metrópole. Mas é claro que não deixo de aproveitar a chance para apreciar a sua beleza!



Mamãe Jacaré de olho em sua ninhada no Pantanal
FOTO © Daniel De Granville, 2006

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