* Por Daniel De Granville com contribuição de Tietta Pivatto.
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Tem uma coisa na qual estou pensando há tempos e hoje decidi escrever a respeito. Trata-se de uma reflexão sobre como serão feitas as fotografias de natureza em um futuro próximo. Vou tentar explicar minha ideia e minhas angústias.
Que o universo digital deixou tudo mais imediatista já é ponto pacífico: mensagens devem ser respondidas em poucos minutos, textos e vídeos têm que ser cada vez mais curtos, uma variada gama de informações sobre qualquer assunto está disponível em segundos pela internet, fotografias são tiradas e divulgadas mundo afora neste mesmo intervalo de tempo. A tecnologia, que deveria nos trazer mais tempo livre, tem ao contrário acelerado nosso tempo, reduzindo prazos para tudo.
... e isso também.
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2007
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2007
Como não poderia deixar de ser, este ritmo tem um reflexo direto no comportamento das gerações mais jovens. Percebo isto no dia-a-dia, seja nas ruas da minha cidade, acompanhando alunos do ensino médio em viagens de estudo ou no contato em redes sociais. Por exemplo, acho que nenhum deles escuta um CD do início ao fim, geralmente elegem a(s) melhor(es) música(s) do disco e as compram separadamente em sites especializados. Aquela obrigação de comprar um CD inteiro já é coisa do passado. Via de regra, nem uma canção inteira eles conseguem ouvir, noto que geralmente tocam menos da metade e já pulam para a próxima.
Mas o que isto tem a ver com a fotografia de natureza?
A exuberante Mata Atlântica que ainda resta em algumas partes do país.
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2009
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2009
Bem, a prática fotográfica também está seguindo rumo semelhante. De maneira geral, fotografar tornou-se um ato automático, impensado, banal até. Tira-se rapidamente dezenas ou centenas de fotos com o celular e coloca-se tudo no Facebook, no Instagram ou no Flickr – ou dá-se apenas uma olhadela no próprio visor do aparelho, seguida de um clique no botão de “lixeira”. Pronto, lá se foram as imagens para sempre. Um ato tão imediatista quanto tornou-se o mundo da informação. A fotografia, que deveria conter poesia, contando uma história apenas com uma imagem, torna-se apenas um registro efêmero, rapidamente substituído pelo próximo disparo.
Sai a natureza, entra o ritmo alucinante das grandes metrópoles.
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2009
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2009
Porém, fotografar a natureza não funciona desse jeito. Os bichos, as plantas, os fenômenos naturais não vivem no mundo da informação rápida. Aquele passarinho continua comportando-se de maneira muito semelhante à dos seus ancestrais, as flores continuam dando o ar de sua graça em determinada época do ano, o sol continua seguindo seu ritmo há milhões de anos, a onça-pintada continua sorrateira e cheia de caprichos para se mostrar às lentes dos fotógrafos. Estar na natureza testemunhando esses momentos torna a imagem especial e única, por carregar em si todo esse conhecimento e sabedoria que só o tempo e a contemplação conseguem traduzir.
E – desculpem-me pelo pessimismo – a coisa só tende a piorar. A ação humana está degradando os ambientes naturais e reduzindo drasticamente as possibilidades de se encontrar locais conservados, onde as fontes de inspiração dos fotógrafos de natureza ainda estejam disponíveis.
Só com florestas e muita paciência é possível registrar cenas assim.
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2006
Foto: © Daniel De Granville | Photo in Natura, 2006
Então, a meu ver temos dois fatores desfavoráveis ao futuro da fotografia de natureza. Por um lado, a atividade exige paciência e respeito a um ritmo cada vez menos compatível com a realidade – temo que poucos das “futuras gerações” conseguirão compreender este aspecto com sensibilidade e dedicar-se horas a ficar parado no mato esperando o momento certo para acionar sua câmera. Ao mesmo tempo, as notícias que ouvimos diariamente sobre o rumo que as políticas ambientais estão tomando são desanimadoras. Se hoje já é difícil fotografar coisas da natureza que há algumas décadas eram relativamente abundantes, amanhã será mais raro ainda. Ou seja, talvez os futuros fotógrafos de natureza precisarão ser mais pacientes do que nós somos hoje, caso queiram mostrar ao mundo imagens espetaculares do mundo natural. Cada vez teremos menos elementos naturais para fotografar, que serão explorados ao máximo. Talvez o imediatismo e a redução da biodiversidade tragam como consequência, entre tantas outras coisas, a redução da riqueza fotográfica. Será um mundo menos colorido esse da fotografia de natureza...
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